Namoros Virtuais

Data: 11 de setembro de 2001

Assunto: Namoros Virtuais

Gente

Entrei na Internet no fim de 1995, embora só haja tido acesso à Web um ano depois. Já naquele tempo se falava em pessoas que se conheciam, se apaixonavam e namoravam pela rede morando geograficamente distantes, mas sempre rejeitei isso. Até 1999, nada semelhante me aconteceu, em grande parte por não gostar do mIRC e de bate-papo, onde, exceto em salas de deficientes, a lentidão da minha digitação me torna desinteressante ou é tomada como desinteresse da minha parte, e fico todo atrapalhado quando várias pessoas conversam comigo ao mesmo tempo. No começo desse ano, uma mulher de Brasília se apaixonou por mim ao ler meu site e, desde então, muitas outras – tantas que já estou perdendo a conta! – se interessaram por mim, embora eu não procure por isso – na verdade, freqüentei o bate-papo do UOL por dezoito meses mas, após duas experiências frustrantes, faz um ano que praticamente não vou lá.

Uma primeira questão a ser levantada é porquê as coisas começaram a acontecer no início de 1999 e não antes. Na época, estava apaixonado por uma mulher que achava inalcançável, inatingível,”muita areia pro meu caminhão”, tanto que a via como sendo cinco a dez centímetros maior do que eu (temos a mesma altura) e descobri que ela também se apaixonou por mim, o que deve ter me feito perceber que uma mulher pode me desejar e amar; em janeiro desse ano, a amiga que me hospedou na Suíça chegou em Recife e me achou mais bonito, os pais desta – que têm dificuldade de me ver como adulto – acharam que cresci e, quando notei que tinha a mesma altura que tal mulher, pensei “oxente, será que ela encolheu?!”– em outras palavras, deixei de me sentir “pequeno” diante das mulheres! Por outro lado, foi nessa época que minha irmã mais velha viajou na Web pela primeira vez, entrou no bate-papo e arranjou um namoro logo de cara, fiquei invocado porque isso nunca havia me acontecido até então e, quando aquela pessoa de Brasília entrou em contato comigo pelo ICQ, de brincadeira passei-lhe uma cantada que, para minha total surpresa, deu certo. Em terceiro lugar, em 1999 fiz uma reforma geral no meu site, sobretudo no design, e ele ficou impecável.*

Outra questão intrigante é porquê faço tanto sucesso com as mulheres na Internet e, fora da rede, nada consigo. Antes de tudo, é mera questão de probabilidade enquanto vivo isolado, pouco saindo de casa e menos ainda em grupo – geralmente saio com um ou dois amigos –, meu site pode ser visto por milhões de mulheres. Nas raras ocasiões em que uma mulher manifestou interesse, desejo por mim no mundo não-virtual, eu não soube o que fazer, fiquei paralisado (para usar uma palavra cheia de conotações relativas à minha deficiência) – em contraste, quando tais situações ocorrem na Internet, fico descontraído porque não levo namoro virtual a sério. Na Internet, todas as dificuldades de uma relação com um homem com PC viram uma abstração, mas são gritantes e assustam a qualquer mulher que me conheça pessoalmente. Meu rosto pode ser até bonito, mas fica contorcido quando me esforço para controlar minha descoordenação motora, meu andar é bizarro e meu corpo, péssimo; por essas razões, saio mal em 99% das fotos que tiro, mas escolhi a dedo as melhores para colocar no meu site, isto é, na rede tenho controle sobre o aspecto estético. Uma mulher que tente conversar comigo provavelmente terá alguma dificuldade para entender o que digo pela prancha com que me comunico e, mesmo se atingir a eficiência máxima, lerá um discurso entrecortado, em que é complicado entender uma frase longa ou uma história contada por mim – nessas condições, é muito difícil jogar “lábia” para uma mulher; já quem visita meu site encontra textos já prontos, cristalinos, fortes, lúcidos e até envolventes – o mesmo ocorria com a mulher citada no parágrafo anterior, que lia cartas minhas; é bom notar que sedução se dá pela linguagem, corporal, falada ou escrita. Em suma, no mundo não-virtual as mulheres me conhecem de fora para dentro – muita gente fica me achando uma pessoa fantástica, inclusive por motivos errados, mas bem pouca fica me considerando um homem fantástico –, enquanto que, na Internet, me conhecem de dentro para fora e parece que a primeira impressão é a que fica.

Se morasse no ou próximo ao eixo Rio-São Paulo, talvez estendido a Brasília, não me faltariam mulheres e talvez já estivesse casado; das namoradas que tive, só uma era de Salvador e outra daqui de Recife – cheguei às vias de fato com esta, mas essa relação foi curta e tão insatisfatória que acabei com raiva. Isso se deve, em parte, a fatores demográficos e sócio-econômicos, já que são os estados mais populosos e com maior acesso à Internet, mas também acho que deva-se à mentalidade tradicional das mulheres nordestinas (e de outras regiões brasileiro). De qualquer forma, nenhuma dessas namoradas virtuais foi capaz de vencer a geografia**, o que só reforça a falta de seriedade com que encaro a coisa; felizmente, meu envolvimento com tais figuras tem sido baixo, com uma ou outra decepção mais significativa, pois conquistar meu coração parece ser difícil***. Porém, esses namoros são ao menos uma chance de eu ter algo com uma mulher e, se não os procuro, também não os recuso quando surgem****.

*NOTA: refletindo sobre os motivos que dei para este site fazer as mulheres passarem a se interessar por mim só a partir de 1999, percebi que, exceto a reforma deste, não explicam muita coisa, pois a maioria das mudanças que citei foram internas a mim e não expressa no site – portanto, não poderiam influir nas mulheres que o leem –, e bem poucos dos meus namoros virtuais começaram devido a uma iniciativa clara da minha parte. Assim, creio que o grande fator da virada de 1999 foi a inclusão de uma página sobre sexualidade, o que, além de ter melhorado o conteúdo, faz as mulheres se tocarem que o dono do site é um homem, e não uma pessoa “genérica”.

**NOTA: desde que escrevi o e-mail acima, tive contato pessoal (e sexual) com seis namoradas, das quais cinco moravam longe e venceram a distância geográfica para passarem alguns dias comigo e me casei com a última.

***NOTA: desde 2004, venho tendo namoradas bonitas, interessantes, às quais tenho amado e que conseguem vir me encontrar.

****NOTA: meus namoros na Internet geram várias impressões erradas que gostaria de desmanchar. As mulheres quase sempre se interessam por mim através do meu site e, quando estava o desenvolvendo, sequer podia imaginar que teria tal efeito e muito menos ter essa intenção. De fato, um site que seduz mulheres é surreal até pelos padrões da Internet, onde a grande maioria dos namoros começam em salas de bate-papos ou programas de mensagens instantâneas. Não vivo pela Internet procurando mulheres, embora não me faça rogado quando uma se interessa por mim. Tentei a sorte em vários sites de namoro, mas nunca consegui nada assim e não pago nenhum.